A paisagem toponímica de Francisco Fernández del Riego IV: O río do tempo

Se há um livro fundamental na obra de Don Paco, este é O río do tempo. Uma história vivida. Nele ... conto o que me sucedeu durante o decorrer de moitos anos, e de todo aquilo do que fun testemuña. O que, no seu contido, pode valer é o decurso completo dunha existencia; a de alguén que fixo o que pensaba que debía facer, pero sempre con relativa prudencia e xenerosidade.”

Trata-se, então, de toda uma trajetória de vida escrita pelo seu protagonista, figura central na Galiza do século XX. Dentre todos os episódios nele relatados, queremos parar em um. Aconteceu em 15 de setembro de 1931:

Abandonamos a casa na que naceramos, e puxémonos en camiño cara ao novo destino. A partida da vila supuxo un insólito acontecemento para as xentes coas que conviviramos. Xuntáronse moitos veciños, algúns con bágoas nos ollos, a nos despedir. (...). Subindo a costa de Arroxo desde a altura, contemplei outra volta -agora con nostálxica mágoa- os lugares acasarados, as minúsculas aldeas. Aí, ao pé da requeixada da meseta galega, quedaba a paisaxe valeca; o xorrar do río no seu embastecemento aluvial; a escura sombra da serra da Cadeira, núa e antiga, sobre a que tantas veces ollara acenderse os candieiros do luceiro da mañá. Viñéronme ás mentes, de súpeto, topónimos moi sabidos: O Cascapizo, A Condomiña, Escourido, Pumar de Dón, A Cazolga, Recemil, Tiagonce, Vilapol... Alá, no fondo, quedaban soterrados os anos da nenez e adolescencia.

A história cobre toda uma geografia de sua terra natal, Lourenzá. A Costa de Arroxo, onde Don Paco parou para olhar para trás, fica no lugar do mesmo nome, na freguesia de Lourenzá. É um topónimo que se repete até 8 vezes no Nomenclátor da Galiza, todas elas, curiosamente, na província de Lugo. Para Nicandro Ares, é um topónimo que vem do latim serodio ARROGIUM, palavra pré-romana que Plínio definiu como ‘galerias subterrâneas ou riachos de água que serviam para lavar minério’. Piel, por outro lado, propõe uma etimologia diferente, "arrojo" com o significado de 'encosta íngreme'. Há ainda que ter em conta que no galego comum temos a palavra arroxa ‘extensão da montanha até onde se queimava a lenha’, o que também pode estar relacionado com o significado deste topónimo.

Condomiña, inscrita até 13 vezes no Nomenclátor, é a evolução para o galego do termo latino CONDOMÍNIA, plural de CONDOMÍNIO, com o significado de 'terreno ou local de domínio comum, partilhado entre vários proprietários'. Conforme indicado por Xosé Ramón López Boullón no livro Toponimia de Ames a respeito do lugar denominado A Condomiña da parroquia do Ortoño, os topónimos que contêm este nome são geralmente de origem medieval.

Existem 12 entidades populacionais denominadas Escourido na Galiza, às quais devemos acrescentar outras 4 denominadas Escouredo, todas elas na província de Lugo. Através do sufixo abundacial -edo/-ido, do latim -ETU, indica locais onde foi depositada a escória, ou seja, os resíduos que permaneceram após a queima de determinados materiais. Escoura é uma palavra que já está gravada em latim, SCORIA, e que vem do grego. Um topónimo relacionado com Escourido e com significado muito semelhante é Escorial ou Escoiral, consoante ocorra ou não metátese silábica.

Na lista de topónimos citados no episódio que encabeça este artigo há cinco antrotopónimos possíveis: Recemil, Tiagonce, A Cazolga. Vilapol e Pumar de Don, visto este último em outro artigo desta série. Recemil e a variante Recimil, é um topónimo presente em sete aldeias do país e num bairro de Ferrol. Vem de uma frase (VILLA) RECEMERI, este último genitivo de um nome de origem germânica RECEMIRUS, que poderíamos traduzir como 'homem rico' e 'famoso', significado das partículas REIKS- e -MIRUS que o compõem.

Vilapol, topónimo que para além de Lourenzá também se repete na freguesia de Portocelo, em Xove, provém de VILLA PAULI, ou seja, uma posse de PAULUS. O primeiro dos elementos do sintetizador, VILLA, foi elidido em nome de outro município de Lugo, Pol.

Mais obscuro no seu significado é Tiagonce, este é um nome único no Nomenclátor, mas poderá estar relacionado com Casaldegonce, nome de uma entidade populacional de Cerdido e com Gonce no concelho de Friol. Quanto a este último, Nicandro Ares julga a sua origem noutro antropónimo, neste caso também feminino, que originalmente se escreveria Gundia.

A Cazolga é para nós, para já, uma incógnita toponímica, pois é também um topónimo único em todo o Nomenclátor da Galiza. Escrito na documentação antiga como A Casolga, poderia ser interpretado como um Cas + Olga, ou seja, a casa de uma pessoa chamada Olga, mas não temos dados suficientes para o garantirmos.

Deixamos para o final o topónimo O Cascapizo, nome de lugar também obscuro na sua origem e único no Nomenclátor. A singularidade deste topónimo é que identificava uma entidade populacional que aparecia nos nomencladores mais antigos, mas que não faz parte do Nomenclátor atual. A razão é que se tratava de uma pequena entidade populacional composta por uma única casa (assim está registada no Nomenclátor do ano de 1868) e também porque a evolução de Vilanova de Lourenzá acabou por integrar este pequeno local no núcleo urbano. No entanto, o facto de ser um topónimo único convida à sua recuperação no novo Nomenclátor de Galicia em que está a trabalhar o Seminário de Onomástica da RAG.

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